Desde a sua primeira edição a Egbé Mostra de Cinema Negro se apresenta como um espaço de aquilombamento, onde cineastas pretas e pretos têm criado e compartilhado histórias que nos ajudam a entender o espaço que ocupamos hoje. Para além disso, a mostra também sempre teve um compromisso com o caráter educacional e, dando destaque a essa vertente, foi promovida neste sábado, 09, a live Cinema Negro e Educação com as participações da pesquisadora e documentarista Edileuza Penha de Souza e da Cineasta e produtora da Mostra Itinerante de Cinemas Negros Mahomed Bamba (Mimb), Daiane Rosário, com a mediação do professor Wolney Nascimento.
Começando a sua fala, a professora Edileuza rememorou um pouco da sua trajetória educacional e pessoal, marcada com muita luta e crença na Educação. “Na empresa onde eu trabalhava, as funcionárias negras passavam por revista íntima. Ainda que eu não tivesse compreensão do que aquilo significava, era extremamente humilhante e eu sabia que não queria aquilo pra mim, então a universidade poderia me trazer esse outro lugar”, compartilhou.
Já em sala de aula, a pesquisadora afirmou sempre ter usado o cinema como um recurso didático poderoso. “Acredito que o cinema tem esse lugar de falar por nós e o que queremos que seja dito”, complementou. Sua carreira acabou a levando à Brasília para trabalhar na lei 10639 que torna obrigatória o ensino de cultura afro-brasileira e africana na educação básica.
“Precisamos garantir que filmes produzidos por realizadores negros e realizadoras negras, estejam dentro das escolas porque eles são, de fato, um instrumento do esperançar, daquilo que bell hooks adota de Paulo Freire para falar desse verbo esperançar. Sem esperança não é possível educação, sem esperança não é possível o cinema negro, falando sobretudo dessa ancestralidade que precisa tomar conta das escolas e dos nossos corações”, complementou Edileuza de Souza, fazendo alusão à lei 13.006/2014 que torna obrigatória a exibição de duas horas de filmes nacionais aliada ao componente curricular escolar.
Trajetórias cruzadas
Mesmo com as diferenças temporais e geográficas, a cineasta Daiane Rosário também compartilhou as dificuldades que lhe foram impostas em sua busca pela educação superior. “Foi um ciclo muito difícil e eu não acho que não existe nenhum glamour, nenhum mérito, esses ciclos já precisam ser quebrados. Nossa história foi de resistência, mas essa continuidade da resistência, nossos ancestrais já doaram bastante para que a gente pudesse estar aqui hoje”, apontou.
Daiane Rosário lembra, ainda, que já na universidade tinha o desejo de estar conectada e ter um espaço para discutir sobre as próprias construções intelectuais e fílmicas. “Pensava esse fazer de cinema diferente, uma construção de roteiro que fosse trazer um respeito ao nosso corpo, a nossa existência e a nossa história”, destacou.
A cineasta destaca, também, outro ponto importante, o da afetividade, principalmente dentro da Mimb. “A gente confronta de cara a base de todo esse sistema, como a gente começa a perder jovens negros porque o acesso à educação é tão dificil porque o sistema condiciona para que esses jovens estejam e permaneçam nesses espaços, então, a gente está num processo de entender que a nossa formação parte de um processo totalmente diferente, ela primeiro vem da afetividade, depois da instrução”, destacou, fazendo referência ao seu projeto realizado com jovens em resocialização no sistema judiciário.
Afirmando estar num processo de reconstrução intelectual fruto da violência racista, Daiane Rosário comentou, também, sobre seu artigo A produção documental de Antônio Olavo: lutas e memórias do povo negro. “A construção eurocêntrica é uma arte muito egoísta. O que Olavo me ensinou é que precisamos ser generosos”, enfatizou.
Para assistir a live completa basta acessar a página da Egbé no Youtube.