Desde o início da nossa história, a Egbé Mostra de Cinema Negro se apresenta como um espaço de aquilombamento se propondo a democratizar e difundir o acesso à potente produção cinematográfica negra no Brasil. Essa missão se estende para além das semanas da mostra, em abril, e vai escoando ao longo de todo ano. Como exemplo disso, realizamos exibições itinerantes em comunidades quilombolas e ribeirinhas no interior de Sergipe, bem como em escolas públicas no estado, como a que ocorreu no último dia 30 de julho, na Escola Municipal Fausto Aguiar Cardoso, no município de Divina Pastora.
A ação foi fruto de uma parceria com o Projeto Pedagógico Negritude Contemporânea, promovido pela professora Eliane Dantas, há cinco anos, sendo três deles em parceria com a Egbé. Comentando sobre os primeiros anos do projeto, a professora Eliane Dantas confessa ter passado por algumas dificuldades, já que Divina Pastora é uma cidade, essencialmente, da fé cristã. “Muitas vezes as pessoas veem a cultura Afro-brasileira como algo negativo, mas tivemos uma aceitação muito grande dos alunos” afirmou, destacando a força com a qual os estudantes abraçaram o projeto no primeiro momento.
“O pessoal que se reconhece negro, no meu ponto de vista, é o pessoal que conhece sua história e Divina Pastora está nesse processo, por isso é muito importante a lei 10.639, de 2003, nas escolas”, ressaltou a professora se referindo a lei que obriga o ensino sobre a História e Cultura Afro-brasileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio.
Ainda segundo a professora Eliane Dantas, utilizar o cinema como instrumento material pedagógico em prol do conhecimento da Cultura Afro-brasileira é muito importante e significativo. “Além da questão audiovisual, da beleza, a Egbé traz histórias de realidades vivenciadas pela comunidade, temas voltados para a população negra, temas sobre mulheres negras, falando sobre dores, alegrias e trazendo representatividade.” A professora destacou, também, a dinâmica de levar os alunos para o centro da discussão, com a presença dos mediadores. “Os alunos têm autoestima de ver um cineasta negro, uma advogada negra, a Egbé mostra possibilidades para os alunos, abre o caminho para que eles se permitam sonhar, traz a esperança e uma nova percepção de quem somos nós, e o cinema indaga o aluno a querer mais. Desde o início foi um encontro muito lindo e por isso não parou mais”, finalizou a professora.
Representatividade e educação antirracista
Para além de exibir filmes e peças audiovisuais, a Egbé também busca abrir portas para o diálogo entre a audiência e os realizadores. Estiveram presentes no evento o diretor de Ancestral, Edwyn Gomes, o co-diretor de Geruzinho, Rafael Amorim, junto a co-diretora Luli Morante, além da atriz Margot Oliveira, de Imã de Geladeira. “Tivemos um debate muito legal com o público. Alguns realizadores puderam estar presentes, e esse é mais um dos compromissos da Egbé, levar realizadores ao público e gerar um debate sobre o tema, sobre a técnica narrativa. Isso faz com que os jovens se sintam representados por termos sergipanos e sergipanas fazendo filmes dentro de uma perspectiva preta”, destacou João Brazil, produtor executivo da Egbé Mostra de Cinema Negro.
João Brazil também enfatizou a importância de promover uma educação antirracista dentro do ambiente escolar. “A escola é um espaço de formação, de troca de conhecimento, e essa é a missão da Egbé, além de dar visibilidade a filmes sergipanos para cada vez mais ascender o direito de acesso dos filmes sergipanos ao público sergipano”, complementou João Brazil.
Exibição em Aracaju
Para além do espaço escolar, a Egbé Mostra de Cinema Negro também realizou a exibição dos mesmos filmes exibidos em Divina Pastora no Abrigo Caçula Barreto, em Aracaju, no último dia 15. Além dos filmes, também foram exibidos os clipes de Lari Lima e do rapper César Griot, ambos disponíveis aqui, no nosso portal.
Satisfeita com as exibições, Thaty Meneses, educadora social do Abrigo Caçula Barreto e parceira da Egbé nesta ação, deu detalhes da noite. “Essa parceria oportunizou nossos jovens a terem acesso a filmes de produção independente. Foi interessante também darem a oportunidade de conhecerem clipes de artistas sergipanos porque eles, em sua maioria, só conhecem artistas presentes na grande mídia e, também, de vibrarem com quem eles já conhecem, como no caso de Lari e César. Eles vibraram bastante quando eles apareceram na tela e eu gostei muito disso”, relembrou Thaty Menezes.
M.G. um dos jovens atendidos pelo abrigo não poupou elogios. “Foi muito bom, muito legal, achei todos os filmes bons”. Já C.O. teve uma experiência mais pessoal. “Eu gostei muito do filme que se passa em São Cristóvão porque eu já conhecia alguns lugares”, ressaltou, fazendo referência ao filme Imã de Geladeira. Para R.S. a exibição dos filmes também oportunizou momentos de reflexão. “Acho que não devemos ser preconceituosos com ninguém e assim, espero que venham mais vezes. É muito bom essa presença”, relatou.
Ainda para este ano João Brazil afirma a continuidade do circuito itinerante, com exibições já agendadas e outras ainda em fase de produção para que a Egbé Mostra de Cinema Negro continue criando esses espaços de formação e oportunizando acesso aos filmes do Cinema Negro dentro do nosso estado.